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ENTRE AS IDEIAS E O AMANHECER

Corri fechei os olhos tentei me esforcei mas não deu tempo…
olho no relógio do celular:
4:58 ouvi o início dos gorgeios com piados baixinhos, um gritinho do Bem-te-vi e os sabiás, em um breve acordar com seu canto curto. A Cigarra, umazinha só, ao longe. Nova tentativa;
5:08 as cigarras que andam umas taradas estão a todo vapor. Bem-Te-Vi agora são bem-te-vis e uns gritam e outros perguntam. Sabiás já dobram seus cantos, cada um com o seu. Os Galos duelam na vizinhança, que com o acordar dos pássaros e das cigarras, eles se empenham, sabe?
5:12 passou um Jacú barulhento embaixo da janela do quarto, mas como eles não andam sozinhos já já o barulho da bandeja do comedouro caindo com o peso do seu corpinho do tamanho de um Chester;
5:18 já começou a clarear. A cabeça meio pesada das poucas horas de sono ainda está repleta de ideias e penso na Monja X meu dia de trabalho com os olhos ardendo;
5:25 Maritacas cruzam o céu e acordam as Cambaxirras que chegam por último com seus corpinhos pequeninos que ecoam alto seu bom dia;
5:29 resolvi sair para fotografar a montanha. Coloquei meu robe de malha cinza que ganhei do Samuel (pai da DonaNora Carol) em um Natal feliz, um lenço no pescoço e me aventurei no amanhecer geladinho. Quase fui atropelada por um Colibri que buscava seu dejejum no bebedouro vazio da varanda. Ao longe, uma pomba Juriti e seu cucuru. O Jacú e seu lamento um-um-um estava descansando e seguiu para o abacateiro. De baixo, achei dois Pica-Pau de crista amarela na investida dos abacates abertos pelo Tucano que já estava de saída passou de leve por cima da minha cabeça. Mas o Jacú com seu corpinho de chester e rabo de pavão balançou tudo e os bichinhos do sítio de Monteiro Lobato se foram. Vi a lua se despedindo enquanto um avião cortava o céu… imaginei estar ali, voando como um pássaro, sem passado presente ou futuro, voando, apenas;
5:40 Dudu, que ainda tinha os olhinhos apertadinhos de sono, me largou no meio do gramado molhado e repleto de cascas de abacates e voltou para dentro de casa. Sábio cão. Hora de fazer o mesmo.
5:45 melhor deixar o dia amanhecer com seus encantos. Vão as coisas e ficam as ideias. Bom dia.
Pedro do Rio, Petrópolis, RJ, 9 de outubro de 2020.

No Instagram, dez fotos do amanhecer que ilustram o texto.
https://www.instagram.com/p/CGIGzYspO4N/?utm_source=ig_web_copy_link

IDEIAS E COISAS NA MADRUGADA

Tenho acordado as quatro da manhã que, para mim, diferente dos galos da vizinhança, é quatro da madrugada. Ainda escuro, tento dormir, uso técnicas da meditação, mas a cabeça cheia de coisas e ideias não me deixa continuar a jornada do descanso.
Consegue entender que ideia é uma coisa e coisa é outra coisa? Pois bem, coisa não parece confuso se eu escrevesse problemas, questões e afins, minhas e, na grande maioria, das outras pessoas que me cercam.
Mas como a vida é movimento e nem sempre o movimento é leve e cadenciado, existem coisas que parecem mais montanha-russa e melhor ser coisa mesmo para ter uma levesa que a vida nos ensina ter.
Posso incluir no departamento coisas, o calor que estou cada dia mais desacostumada, o ventilador que resseca a respiração da alérgica, que para controlar a respiração nestas horas da madrugada, de boca aberta e com os galos cantando e a cabeça girando é coisa que ganha o comum nome de insônia. Mas não sou comum e essa coisa de acordar na madrugada nem sempre é divertido. Sim, acordar às quatro da madrugada, ir fazer xixi, Dudu aproveita para ir também, voltar, organizar o corpo e a cabeleira, fechar os olhos e, nada.
Mas hoje lembrei da Monja (a Coen) nas ideias, ali já perto das quatro e meia da madrugada. Um dia ela disse que se estamos acordando no meio da noite ou demorando para dormir, quem sabe o melhor é não insistir e aproveitar com algo produtivo. E cá estou nesta falação nos vossos ouvidos aproveitando a sugestão da sábia Monja que cada vez mais me devolve aos ensinamentos do Budismo e do Induismo.
Entre coisas e ideias, já abandonei as coisas e vou ali anotar umas ideias antes do amanhecer acontecer além dos galos e aí levanto para fotografar as montanhas e o dia começará por aqui sem uma nova tentativa de não ter os olhos ardendo por todo o dia. Silêncio, os passarinhos ainda estão dormindo, melhor eu apoveitar e ir também.

Pedro do Rio, 4h55 de 9 de outubro de 2020.
Foto cedida gentilmente pelo mestre @leoaversa São Petersburgo, 1991.

Publicado também no perfil do Instagram: https://www.instagram.com/p/CGIErixpgxZ/?igshid=ku4vfpgtst3y

herança da Terra

Quando honro as minhas origens de filha de lavrador do Espírito Santo, que me empresta seu nome e me nomeia filha de um ser do campo, da coragem de quem semeia neste imenso país. Aqueles que também abandonam o sonho da terra fertil por dias melhores nas grandes cidades. Assim me fiz filha de um homem da terra, que me deixou a herança do plantar e do colher com a emoção de quem semeia a vida para ver brotar dias melhores. E hoje colho laranja na @casa_passarim e hoje, repleta de amor pelo dia lindo na serra, desejo partilhar com todos esta beleza de luz, de perfume de fruta fresca, por dias mais iluminados e simples, com a bênção da sábia mãe natureza. Gratidão a @joanawv @lobogila Nuxa, Sergio, Fabinho e @antoniocoutinhoc , que me acolheram em familia. #semfiltro #casapassarim #pedrodorio #petropolis #rj #espiritosanto #santaleopoldina #santateresaes 📷@deisecardosodeabreu

Publicado originalmente no Instagram, dia 30 de março

Encontros

Um dia, entre uma aflição e outra do coração apaixonado e teimoso, Dr. Antônio me disse: “benditos sejam aqueles que se encontram no mesmo momento de vida”. De alguma forma sabia que ele estava me dizendo: game over, minha cara. Mas quando volto uns bons anos daquele dia com o meu terapeuta, lembro perfeitamente quando uma astróloga me falou de encontros a partir dos meus trinta anos. “Amigos para toda uma vida”, ela disse.
Olho na parede do escritório a foto da turma do meu primeiro ano de escola e percebo que não tenho um grupo de amigos de infância, da escola, do bairro, mas encontrei meus melhores amigos – aqueles que seguram a minha mão, me aturam, contam comigo em todos os momentos – a partir de1994. Coincidência ou não, ano que completei meus 30 anos.
E foi num encontro que tinha tudo para ser um desastre que conheci Gila, minha amiga Giloca. Parceira de praia, da bicicleta, de conversas, de comer no natureba do Recreio, fala mansa, pessoa querida que me trouxe para as bandas de Petrópolis quando eu buscava um porto e achava que ele seria numa cidade de praia. Gila me acolheu num trabalho onde cheguei e descobri que o meu cargo já era dela há 15 anos. Ela foi generosa e fizemos uma boa dupla. Pouco tempo depois desisti do contrato de trabalho, mas não desisti da nossa amizade, que este ano completou 10 anos.
A partir deste encontro hoje resido no sítio que abriga uma grande família, que inclui a família da Gila. E andando por aqui vi umas plaquinhas que me eram familiar. Descubro que a nova vizinha no sítio é a Elen, a gentil pessoa que coloca placas pela Zona Sul do Rio de Janeiro, com o seu afetuoso projeto “Emplaque o Bem”.
E vejo encanto nestas pessoas que emplacam árvores, que acham lindo uma perereca do tamanho de um sapo, ou que param o transito para interromper o trajeto de um tatu que poderia ir para a BR e, assim, ser atropelado.  Fico feliz pelo encontro com a Elen neste refúgio junto à natureza no mesmo momento das nossas vidas. Percebo que encontrei uma boa turma para os próximos tempos.
Estar em harmonia com o seu tempo e o seu lugar é estar em sintonia para ir de encontro a pessoas que estão na mesma frequência.
E você, já encontrou a sua turma?

Pedro do Rio, Petrópolis, RJ, 18 de outubro de 2018,

Foto das placas que a Elen me presenteou e colocou na pitangueira, na entrada da minha Casa Passarim.

 

Reinventar Certezas

Poderia começar com: não desista dos seus sonhos. Mas o que eu sonhei mesmo? Pois bem, prefiro imaginar que sonhos são por etapas da vida, das circunstâncias da vida, da quantidade de responsabilidades que assumimos perante nós e aos outros, como filhos, pais, cachorros, relacionamentos amorosos ou afetivos, carreiras. Mas o que você sonhou mesmo? Quando foi isso, ontem? Olha, já se passaram vinte anos desde aquele dia que você jurou que mudaria de vida.
E toda hora tudo já passou e quando olhamos em volta, temporadas inteiras das nossas vidas também passaram neste amontoado de segundos. Mas quando crianças não sabemos o que significa o tempo, mas quando nos damos conta aquela criança já cresceu e aquele jovem repleto de sonhos e coragem já ficou lá para trás. Certo? Não, errado.
Faça o que tem que ser feito, mesmo que não seja aquela vida dos sonhos, faça um plano e siga, siga em busca das etapas. É que imagino que por etapas pode ficar mais fácil para não parecer que aquele dia que sonhei nunca vai chegar, sabe? E quando a barra pesar é provável que você vai achar que não dará conta. Neste momento, para tudo e vai tomar um banho de mar, caminhar, beber um vinho, sei lá, mas faça alguma coisa que possa te tirar do “modo à deriva”.
Com tudo isso, há alguns anos, mesmo com as etapas, o siga, o faça o que tem que ser feito, balancei feio com o desafio de vivenciar três anos de grandes perdas, muitas mudanças, sonhos novos por água abaixo.
Ano passado, com sonhos antigos ainda encaixotados, arrumei coragem para dar início a uma nova etapa, com uma certa desconfiança se ainda teria fôlego, dúvidas se algum plano poderia dar certo após tempos tão confusos. E foi no exato primeiro movimento, uma viagem para Montevidéo, onde fui acolhida pelos amigos Tamy e Francisco (e Mimi), que ouvi duas músicas que me encheram o coração de coragem para reinventar certezas. Isso mesmo, reinventar as minhas próprias certezas.
As canções Alice, do Matheus Von Krüguer, e Imposibles, do Fernando Cabrera, fazem parte do repertório de Parador Neptúnia, CD da Tamy, lançado durante a minha estada no Uruguay. A primeira, Alice, me deu “reinventar certezas”. A segunda, Imposibles, me disse: Tá loco aquel que quiera volar / Buscando un sitio al lado del sol.
Mais um ano se passou e há algumas semanas a cartinha astrológica da amiga Piky no Instagram (@magaatrologica), dizia: “Saturno gosta de gente comprometida e por isso às vezes dificulta nossa vida. E aí? O quanto você quer esses sonhos todos que você diz? Se esforça quanto?”. Li e sorri, entre as certezas e os sonhos que não estariam mais encaixotados dali em poucas semanas, quando coloquei em prática uma nova etapa da minha vida, com uma casinha nova, pequinina, com um gramado para molhar, algumas árvores frutíferas, novos amigos para conquistar, umas montanhas, alguns muitos pássaros e um silêncio que fala com o meu coração.
Ok Saturno, desafio aceito: reinventei minhas certezas e achei um lugar ao lado do sol para a minha casa Passarim, para continuar acreditando nos meus sonhos.

Pedro do Rio, Petrópolis, RJ, 2 de setembro de 2018.

Alice (Matheus Von Krüguer): https://www.youtube.com/watch?v=JrIabf34PMI
Imposibles (Fernando Cabrera): https://www.youtube.com/watch?v=ngEl1cN2240