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ETERNIDADE NO MEU JARDIM

Todos os dias eles me esperam com suas cores que brilham nos abacateiros, enquanto busco os frutos e ofereço nos comedouros. Agradecidos, piados e conversas que se parecem mais com a cozinha animada da minha casa quando lotada de amigos. Passam o dia assim, animados. Na varanda, colibris reclamam do cansaço que me fez acordar tarde. Seus bebedouros estão vazios.

Comedouro das rolinhas, canários e pombas juritis está do outro lado, com muita misturinha de milho picado e grãos gostosos para paladares exigentes. Começou a chover e tudo volta a estar verdinho, semeando os ventos de agosto.

É setembro. Todos estão afinando seus cantos – pipiripipi, cucurucuri, bennteviii, filfilfilfil, crooocrooo. Estão empenhados nas conquistas, catando gravetos, buscando locais seguros para novos ninhos. Na bromélia imperial da varanda, Saíras 7 cores, Saí-azul como lápis lazuli,  se banham para refrescar. Pica Pau de cabeça vermelha e de cabeça amarela, o Japú preto como a noite, mas com bico e rabo amarelos que, quando voa, um leque laranja se abre nas nossas cabeças, fazem um apito para avisar que tem comida abundante. Um jovem tucano chama sua família do galho mais alto do abacateiro lotado de frutos maduros.

Jacus, uma mistura linda de galinha com urubu, chegam ao amanhecer e retornam ao cair da tarde. Andam sempre pelo gramado e sentem muita fome. Comem tudo, são imensos e voam alto. Quebram comedouros com suas silhuetas de chester. E, na qualidade passarinhada, a pequenina cambaxirra, em casal, que todos os anos prepara a casinha no alto da varanda para a chegada dos pequenos. Ariscos Bem Te Vi e Sanhaço verde azulado disputam com o anfitrião de tudo por aqui, o Sabiá e seu canto que ecoa. E nem falei nas animadas Maritacas, o casal de João de Barro e os Canários amarelinhos.

No início da primavera se faz o novo ciclo de vida, das plantas e dos animais, dizem ser o Equinócio da Primavera, que amorosamente batizei de meu jardim! Aquele que vive o mistério da eternidade da sua natureza.

DIA DE COSME E DAMIÃO, DIA DE MUITAS LEMBRANÇAS

Dia de Cosme e Damião, que para os crédulos inclui o pequeno Doum, que de tão pequeno, quando se foi,  não deu tempo de aprender a falar.
Hoje fiz um agrado para as crianças, como faziam minha mãe e meu Tio Adilson.
Mamãe adorava ir na Casa do Biscoito para comprar caixas de doces para fazer os saquinhos. Nos seus últimos anos, já com pouca memória, eu e meu filho Diego íamos para lá distribuir os doces dentro dos saquinhos, pois se deixássemos com ela sozinha um ganharia só bananada e pirulito e outro suspiro e Maria-Mole.
Era divertido vê-la feliz fazendo aquela confusão para encher os pacotinhos com a foto dos santos estampada no papel. Depois, chamava as crianças do condomínio e passava a semana contando como foi a bagunça na sua janela, no apartamento de primeiro andar. Já o Tio tinha uma prateleira com um pequeno altar aceso com uma lâmpada tipo bolinha, colorida de abobora ou azul, mas sempre acesa, com um pratinho com doces e três copinhos pequeninos, que sempre tinha guaraná. O Tio trocava doces, balas e guaraná por todos os fins de semana de sua vida.
Mamãe e o Tio eram os irmãos mais novos, ele o caçula com diferença de quatro anos para ela. Mas quis o destino que eles tivessem juntos o Tifo. Ele criança, ela quase mocinha. Uma doença que matava, com uma febre que cozinhava o enfermo. Sobreviveram. Dizem que graças a fé de minha vó nas crianças da crença popular – São Cosme e São Damião.
Hoje lembrei deles e corri na rua para comprar uns doces. Liguei para a Tia Marlene (mulher do Tio) e descobri que ela havia feito o mesmo, correu na rua para arrumar o altarzinho dos santinhos.
Independente da nossa crença, carregamos a crença dos nossos e hoje me senti um pouco perto deles, que partiram quase juntos em 2015.
Achei que ficou bonitinho, coloquei uma rosinha. Agradeci, desejei parabéns e fiquei feliz com o ritual tão familiar.
Feliz dia de Cosme, Damião e Doum.

Pedro do Rio, 27 de setembro de 2020.
Foto que fiz da da homenagem, com doces e a velinha.