“A culpa é daquele irresponsável que fui, quando achava que ter cinquenta anos estava muito distante e isso não era problema meu.”. E gargalhei com prazer ao ouvir a sentença de alguém que quase morreu perto de completar meia década de vida. Percebi naquele momento que não foram muitas as minhas irresponsabilidades enquanto tentava fazer tudo dar certo, como a mãe do Diego, que também não imaginava muita coisa, pois também era jovem.
Mas o tempo, esse caprichoso e desobediente, passou. E, um dia, já perto dos meus cinquenta anos, cheguei à banca de jornal do Sr. Luiz e, com a festa habitual dos nossos encontros, de repente, o senhorzinho de quase oitenta anos falou com aquele sotaque italiano: “Siuvlana, você é uma jovem senhora muito bonita”.
E ganhei o fim de semana com o elogio. Sim, eu já me sentia uma jovem senhora e já começava a delinear um recomeço, após tanta responsabilidade. Também já estava na hora de ser irresponsavelmente livre, cuidar um pouco mais exclusivamente de mim, voltar a estudar, encontrar a minha essência, buscar um plano para antigos desejos, colocar uma nova vida em prática.
Em pleno processo olho em volta e vejo os que amo, procuro me manter por perto, mas percebo também que começo a aprender a caminhar por mim, enquanto mantenho as duas gotas de óleo na colher, enquanto aprendo a ser mais leve, enquanto recomeços, enquanto melhora a confiança para os novos tempos.
Meio de careta, a mãe do Diego continua a andar por ai sem medo de bicho papão, na companhia de uma xícara e café pela manhã, uma taça de vinho à noite, rodeada dos meus, contando boas histórias e sorrindo, na construção se ser uma sábia senhora, apenas.
Foto pelo veloz olhar do amigo-irmão-amado Marcos Hermes, em um dia de encontros felizes, de amigos e trabalho, na CDA, no Rio de Janeiro, em abril.
Para ouvir: Alma Nua (Vander Lee)
Não deixes que façam de mim
O que da pedra Tu fizestes
E que a fria luz da razão
Não cale o azul da aura que me vestesDá-me leveza nas mãos
Faze de mim um nobre domador
Laçando acordes e versos
Dispersos no tempoPro templo do amorQue se eu tiver que ficar nu
Hei de envolver-me em pura poesia
E dela farei minha casa, minha asa
Loucura de cada dia
Dá-me o silêncio da noite
Pra ouvir o sapo namorar a lua
Dá-me direito ao açoite
Ao ócio, ao cio
À vadiagem pela ruaDeixa-me perder a hora
Pra ter tempo de encontrar a rima
Ver o mundo de dentro pra fora
E a beleza que aflora de baixo pra cimaÓ meu Pai, dá-me o direito
De dizer coisas sem sentido
De não ter que ser perfeito
Pretérito, sujeito, artigo definido
De me apaixonar todo dia
E ser mais jovem que meu filho
De ir aprendendo com ele
A magia de nunca perder o brilho
Virar os dados do destino
De me contradizer, de não ter meta
Me reinventar, ser meu próprio deus
Viver menino, morrer poeta
Lindo texto, Querida!
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